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Mostrando postagens de 2014

O que o esporte nos ensina

Quando eu e a Simone decidimos trocar nossa filha de escola, no final do ano passado, levamos em conta, além da óbvia questão da qualidade do novo colégio, também um fator que sempre consideramos importante na educação: a prática esportiva. Pois esta semana, ao participar da estreia em sua primeira competição oficial na seleção de handebol do Rosário, Manoela e suas colegas de time deixaram uma lição a nós, adultos. Ao terminar a partida, olhei para a Simone, que acompanhava o jogo nas arquibancadas ao meu lado, e sem entender muito o que se passava em quadra, perguntei. “O que elas estão comemorando?”. Mesmo derrotadas por 10 a 8, as meninas se abraçavam, gritavam e pulavam. Do outro lado, o time vencedor assistia à cena, meio incrédulo, sem o mesmo entusiasmo. Mais tarde, nossa filha nos explicou o motivo de tamanha euforia: elas haviam enfrentado uma equipe superior, com jogadoras nascidas no ano de 2000, enquanto todas do time dela eram de 2001. Nessa fase de crescimento em que se

Sem direito de se omitir

"Nós não nos omitimos", disse um sereno João Carlos Bona Garcia diante da plateia, na sua maioria composta por jovens estudantes que lotavam o auditório da Faculdade de Comunicação da PUCRS, na noite de terça-feira. Estudantes que ainda nem eram nascidos quando Bona Garcia atuava como militante, apanhava e era torturado nos porões escuros da ditadura. E que só conheceram o golpe militar e as consequências do terror que se sucedeu no Brasil, por meio de leituras e documentos. Ou pelos relatos de quem viveu aqueles 21 anos terríveis, caso deste passofundense, economista, advogado e ex-juiz do Tribunal Militar (sim, acreditem), que literalmente sentiu na pele os horrores de um regime imposto à força pelos militares. Nasci em 1964, e cresci alienado. Quase nada conversávamos em casa sobre o golpe e os governos militares. Talvez tenha sido a forma encontrada por meus pais para proteger seus 4 filhos, afinal, vivíamos sob um regime de terror. Quanto menos soubéssemos, mel

Parou por que, seu juiz?

Estrela e Esmeraldino disputam uma renhida final da segunda divisão, definindo qual dos times participaria do principal campeonato de futebol do Estado no ano seguinte. A torcida estrelense, inflamada, urra junto ao alambrado. Fica ainda mais indignada quando, subitamente, o árbitro interrompe um rápido contra-ataque da equipe local, que colocaria o centroavante Aipim na cara do gol. O apitador levanta os braços, se dirige à lateral do gramado e diz ao chefe do policiamento: - O senhor precisa tomar uma providência e prender quem está me caluniando. Ao perceber o olhar de espanto do policial, continua: - Não está ouvindo que estão me chamando de ladrão, dizendo que eu estou roubando do time deles? Isso é calúnia, exijo que se cumpra a lei. - Mas meu amigo, o estádio inteiro, quase 10 mil pessoas, está lhe chamando de ladrão. Quer que eu prenda todo mundo? Vai faltar camburão! A essa altura, um cidadão baixinho, de bermuda e sapato mocassim, já havia invadido o gramado: - Sou juiz da

A tese

Certa vez, em uma mesa de bar, um amigo daqueles que sempre tem uma tese acerca do gênero feminino, largou essa: - Existem dois tipos de mulheres: as feitas para casar e as feitas para se divertir. Levei em conta o fato de já estarmos bebendo há mais de duas horas, mas segui dando corda: - E qual os atributos que incluem uma mulher em um ou outro desses grupos? - perguntei. - Para casar, inteligência e beleza. Para se divertir, apenas beleza é suficiente - respondeu ele, dando um gole na cerveja e deixando aparecer um discreto sorriso no canto da boca, daqueles como se pensasse "como sou brilhante". - E o que dizer, então, das que tiveram o azar de não ter nenhuma dessas virtudes? Ou que possuem apenas a inteligência? - Essas, servem somente para integrar as estatísticas de população mundial, por exemplo, ou para pesquisas sobre eleitoras femininas. Coisas deste tipo - continuou ele. Preferi não insistir, para que ele não seguisse com suas teorias e seu ar de superiori

Almoço de Natal

Não lembro de ter faltado alguma vez peru na ceia de Natal lá de casa. Meus pais – seu Orlando,um operador de máquinas de uma indústria metalúrgica, e Niles, uma dona de casa que eventualmente costurava para fora, mas que nos últimos anos de vida fez disso uma rotina porque a situação apertou – sustentavam os três filhos com esforço e dificuldades, mas não nos deixavam sem nada do que era básico. Eu, Mariana e Orlando Jr. terminamos o ensino médio estudando sempre em escola pública. Somente eu conclui uma faculdade, minha irmã casou cedo e seguiu o destino da maioria das meninas do bairro, virou dona de casa e mãe. Meu irmão herdou do pai não apenas o nome, mas também o gosto pela carreira no ramo da metalurgia. Trabalha até hoje na área e voltar a estudar não faz parte de suas prioridades. Antes, está colocar os dois filhos em uma faculdade, "nem que precise morrer trabalhando para pagar", levar a mulher para conhecer Foz do Iguaçu, "com aquelas cascatas que são a coisa

Quanto você vale?

8 da manhã. A colega "de firma" entra no ônibus e se senta ao meu lado. Com fones nos ouvidos, a loira de cabelos longos não pede licença e nem dá bom dia. Coloca uma enorme bolsa sobre o colo e, de dentro dela, começa a tirar espelhinho, lápis, batom e blush. E eu lá, firme, com um olho no meu livro. No percurso de pouco mais de 15 minutos entre a parada na qual ela subiu e o ponto final, em nosso local de trabalho, ela não faz outra coisa a não ser se maquiar. Quase no estacionamento, ainda consegue tempo para, com seu IPhone, bater quatro ou cinco fotos dela mesma. Freneticamente, começa a digitar algo no teclado touch. Certamente, para publicar as fotos no face ou instagram. Então, ela se levanta e caminha na minha frente pelo corredor. Nas costas de sua blusa, um detalhe não tão insignficante que me fez rir baixinho. Uma etiqueta que esqueceu de tirar: R$ 19,90.