A felicidade está na praça de alimentação

Foi a primeira vez que vi um cantor de praça de alimentação feliz. Dois, na verdade, já que era um casal que embalava a noite de sexta-feira naquele shopping de Porto Alegre. Cantor de restaurante, praça de alimentação ou bar, juntamente com garçom encarregado de servir cupim em espeto corrido, são os profissionais mais deprimidos que conheço. O primeiro pela frustração de saber que quase ninguém presta atenção no que ele canta, poucos o escutam, pois as pessoas estão mais preocupadas com seus filés, talharins, fritas e chopps, ou em conversar com o companheiro de mesa. Difícil vai ser algum executivo de gravadora descobri-lo naquele canto, quase sem ser ouvido.
O segundo, porque se sente desprezado, por mais simpático que ele se esforce em ser, oferecendo aquele espetão enorme e tendo, quase que invariavelmente, um "não"como resposta. Afinal de contas, quantas são as pessoas que cometem a insanidade de ir a uma churrascaria para comer cupim, sabendo que na seqüência virá um espeto de picanha suculenta ou um filé no alho e na manteiga?
Mas voltando à praça de alimentação, o casal cantava e sorria, sorria e cantava. Ele no teclado, e ela, acompanhando na voz e nos braços, agitados ao ritmo da música. "Quem dera ser o peixeeee, pra neste lindo aquárioooo mergulhaaarrr...". Aquilo me chamou a atenção, já que tinha esquecido há muito tempo da Simone, que se demorava em decidir, na loja ao lado, se levava pra casa o lenço com bolinhas cor-de-rosa ou coloridas. O fato de o shopping ser pequeno, um centro comercial, na verdade, e a praça de alimentação dispor de poucas mesas, tornava o ambiente mais próximo e aconchegante. Os clientes pareciam gostar do que ouviam. E os cantores sentiam a receptividade, cada vez mais entusiasmados a cada interpretação. Acontecia, inclusive, de as pessoas interromperem suas garfadas e seus goles para aplaudir ao final de cada música. Cantor de praça de alimentação aplaudido, isso é incrível!! As mais empolgadas chegavam a se levantar, se aproximavam da dupla e, com um bilhetinho na mão, se arriscavam até a solicitar uma canção, no que eram prontamente atendidas. Um senhor não escondeu o entusiasmo quando a cantora, ao final do "quem dera ser o peixeee...", se dirigiu a ele e falou o seu nome, afirmando que acabara de atender o seu pedido.
Não sei como a noite acabou, já que a Simone finalmente se decidiu pelo lenço com as bolinhas coloridas, e fomos embora. Mas aposto que o público voltou para casa feliz, como se tivesse acabado de ouvir a Marisa Monte no mais confortável teatro da cidade. O que me faz lembrar: a felicidade pode estar nas coisas mais simples da vida. O homem é que complica na hora de encontrá-la.

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